O
primeiro parto de Vanessa foi hospitalar e o segundo foi em casa.
Ambos partos normais realizados por obstetrizes. Ela conta que sua
mãe tentou a todo custo convencê-la a fazer cesárea na primeira
gestação porque não conseguia compreender o que levaria uma mulher
a querer parir naturalmente, mas Vanessa seguiu firme em sua
determinação porque acredita que o parto natural é infinitamente
melhor para mãe e para o bebê. Para ela, os bebês ficam dentro do
útero até estarem prontos para sair e que tirá-los prematuramente
pode causar impactos negativos à sua saúde. “Parto natural é
menos conveniente para os médicos?”, ela pergunta. “Que seja. Eu
me preocupo mais com a saúde do meu bebê do
que
com os
horários
do médico!”.
O
parto do primeiro filho foi no hospital simplesmente porque ela não
conhecia nenhuma casa de parto perto de sua casa. Perguntei à
Vanessa porque ela optou por receber assistência de uma obstetriz
para fazer os seus partos em vez da de um obstetra. Ela explicou que
no Canadá boa parte das mulheres prefere obstetras por
desinformação, julgando que seja melhor ter um médico “de
verdade”, mas ela preferiu a obstetriz que iria acompanhá-la em
toda a gestação e também no parto. O obstetra não – você é
acompanhado por um durante a gravidez, mas na hora de ganhar quem faz
o parto é outro
(o
que estiver de plantão naquele dia no hospital).
Além disso, o obstetra de plantão atende a um monte de mulheres ao
mesmo tempo e só vê se está tudo bem com você de tempos em tempos
(nos
outros momentos são
as enfermeiras que cuidam de você). Já
as
obstetrizes ficam o tempo todo com você dentro do quarto do
hospital.
Ela explicou também que no Canadá as obstetrizes são obrigadas a
fazer cursos de atualização a cada ano e podem
se filiar a um único
hospital
de sua escolha para fazer os partos. Saber em qual
hospital a obstetriz está registrada para trabalhar é algo que
a gestante deve
considerar antes
de
decidir por uma.
Por
ter optado ser acompanhada por uma obstetriz em vez de um obstetra,
Vanessa presumiu que não precisaria de uma doula. (No
Canadá os serviços de doula não
são financiados pelo governo e custam
mil dólares -
valor
que
inclui
também
visitas
pré e pós-natal.)
Ela
conta que esse acabou sendo seu maior arrependimento na primeira
gestação. Ela foi descobrir na prática que obstetrizes, assim como
obstetras em geral, não trabalham o parto “com” a mulher do
jeito que faz uma doula. Em suas palavras: “Elas estão lá para
cuidar da segurança do parto e assistir ao bebê na hora do
nascimento”. Já as doulas, ela explica, se dedicam a garantir o
bem-estar da mulher em cada etapa do processo e oferecem todo amparo
e apoio emocional de que ela precisa durante o trabalho de parto –
fazendo massagens, trazendo comida/bebida, orientando o parceiro
sobre como ajudá-la, ensinando-a como respirar e sugerindo posições
que amenizem sua
dor, por exemplo. Ao contar sobre sua primeira experiência de parto,
Vanessa lamenta: “Como eu queria que alguém com conhecimento e
experiência estivesse lá para cuidar das minhas necessidades! Meu
marido e eu não fazíamos a menor ideia do que estávamos
fazendo...”.
Abaixo
vamos conferir o relato de suas duas experiências!
Primeiro
parto (hospitalar) – 24/12/2010 – com 40 semanas de gestação
Hudson
nasceu com 3,950 kg e 54 cm
Na
primeira gestação, minha bolsa rompeu
durante a noite. O líquido não saiu de uma vez, mas foi escorrendo
aos poucos e, embora eu tenha sentido algumas contrações, elas eram
leves e foram diminuindo até desaparecerem de vez. Como o resultado
do exame de cotonete (comumente feito na 37a semana para detectar a
presença de uma bactéria na vagina) deu positivo, meu parto acabou
sendo induzido para evitar o risco de infecção. Isso me deixou
muito chateada porque eu tinha sonhado com um parto natural, sem
estar presa a aparelhos. Foi horrível ficar deitada numa cama de
hospital, com fios e tubos amarrados em mim durante todo o trabalho
de parto.
A
ocitocina sintética utilizada para induzir o parto fez efeito
rapidamente e intensificou absurdamente as contrações. Depois de 6
a 7 horas de fortes
contrações, eu não aguentava mais. A dor era tanta que eu berrava.
Eu estava apavorada com o que estava acontecendo comigo, mas como não
havia intervalo entre as contrações, eu mal conseguia falar. Me
senti completamente fora do controle, sem poder retomar o fôlego. A
dor era descomunal.
Eu
implorava por alívio. Finalmente, o anestesista chegou para aplicar
a pelidural quando eu estava com 7 cm de dilatação. A primeira
picada doeu e a agulha na minha coluna causou ainda mais dor – como
não era para doer, o anestesista retirou a agulha para tentar de
novo. Na segunda vez ele comentou que não “parecia certo” e
resolveu retirá-la DE NOVO. Na terceira tentativa parecia “perfeito”
para ele, mas não diminuiu em NADA a minha dor e, durante todo esse
tempo em que ele picava as minhas costas, apesar de as contrações
continuarem vindo, eu precisava ficar imóvel. Foi terrível. O
processo todo levou quase uma hora, até que finalmente ele conseguiu
administrar uma dose suficiente para aliviar um pouco a dor.
Estando
anestesiada ainda era possível sentir as contrações, mas com menos
intensidade. Como meu corpo não estava completamente dormente, eu
ainda podia me movimentar com certa
facilidade (limitada pelos fios e tubos ligados a mim, é evidente).
Algum tempo depois cheguei à dilatação máxima e estava pronta
para o momento expulsivo. A obstetriz assistente me manteve deitada
de barriga para
cima o tempo todo, dizendo pra eu segurar a respiração e fazer
força. Não estava funcionando e eu perguntei muitas vezes se não
tinha outro jeito de empurrar. Ela disse que esta era a única forma
(eu não acreditei nela, mas não sabia o que mais poderia fazer) e,
depois de duas horas fazendo isso, eu me rendi. Eu
estava completamente
exausta. Todos os meus esforços não tinham levado a lugar nenhum.
Eu estava em trabalho de parto há 12 horas e com muito medo do meu
bebê nunca nascer.
A
obstetriz principal me mandou para o banheiro, para eu me sentar no
vaso, apagar a luz, ficar um pouco a sós e tentar me “recompor”.
Caminhei até lá (sem auxílio e ainda carregando comigo os tubos
intravenosos e o cateter da pelidural!) e me sentei no vaso. Pensei
comigo: “Meu filho precisa nascer AGORA ou algo horrível vai
acontecer!”. Fechei os olhos e comecei a berrar e a empurrar como
se a minha vida dependesse daquilo. As obstetrizes e enfermeiras
correram para dentro do banheiro para me acudir e tentar me levar de
volta para a cama. Mal
sabiam elas que eu estava
decidida a não ir a lugar algum!
Dois minutos depois da
minha decisão de fazer o
bebê nascer a qualquer custo, meu filho voou para baixo. A obstetriz
assistente precisou se jogar no chão do banheiro para conseguir
pegá-lo.
Como
o expulsivo foi rápido demais e sem auxílio, tive lascerações de
3º grau no meu reto. As obstetrizes presumiram que meu corpo estava
completamente
dormente (mas não estava!) e fizeram a sutura sem anestesia local.
Foi uma dor horrível, mas as agulhas costurando as
minhas partes mais
íntimas foram insignificantes perto da dor que eu já sentira no
trabalho de parto até aquele momento.
Àquela altura eu já não me importava mais.
Passaram-se
seis meses até eu conseguir fazer sexo de novo. E ainda assim, com
muita dor. Felizmente, posso dizer que com o tempo as feridas sararam
por completo, sem deixar sequelas. Apesar do seu nascimento
dramático, o que senti ao ver meu filho pela primeira vez foi algo
profundo e inexplicável. Eu sabia, naquele momento, que daria a
minha vida por ele. E a intensidade desse amor só cresceu nos dois
anos que passamos juntos
até agora. Toda a dor, as feridas e o tempo de recuperação pelo
qual tive de passar valeram MUITO a pena. Eu não sabia o que era
amor incondicional até conhecer o meu filho.
Segundo
parto (domiciliar) – 22/10/2012 – com 41 semanas e 1 dia de gestação
Sienna nasceu com 4,450 kg e
54 cm
Na
segunda gestação, eu queria muito “consertar” o que eu
tinha feito de errado da primeira vez. Planejei um parto natural em
casa com o auxílio de uma doula (além das obstetrizes).
Infelizmente, o exame de cotonete deu positivo de novo, porém fui
informada de que não precisaria ir ao hospital, pois poderia tomar o
antibiótico em casa.
Passaram-se
oito dias da data provável de parto e, nesse meio tempo, tive dois
falsos trabalhos de parto. Nas duas vezes tive contrações medianas
por muito tempo – pensei que fosse a hora! – mas elas
simplesmente desapareceram depois de algumas horas e eu acordava no
dia seguinte grávida de novo. Foi muito FRUSTRANTE! Fiquei pensando
que minha filha não
fosse nascer. Por isso, quando as contrações voltaram eu não quis
contar para ninguém e passar vergonha de novo por estar “errada”.
As
contrações retornaram de uma hora para outra e estavam muito, mas
muito fortes. Ela vinha em intervalos de 10-15 min e era TÃO intensa
que eu precisava parar tudo o que eu estava fazendo para me
concentrar até ela cessar. Liguei para a obstetriz e ela me disse
que ainda era cedo porque eu estava no início do trabalho de parto e
que ainda levaria horas. Ela me orientou a ligar de novo quando o
intervalo entre uma contração e outra fosse de 5 minutos há pelo
menos 1 hora.
Tomei
banho e almocei entre as contrações, sempre parando tudo quando
elas vinham para me concentrar até que a dor passasse. Avisei meu
marido que precisaria ir ao hospital tomar anestesia caso as dores
ficassem muito piores porque eu achava que eu não conseguiria
aguentá-las. Por aproximadamente três horas, o padrão se manteve.
Apesar da dor intensa, o intervalo entre contrações permanecia de
10 min e era tempo mais do que suficiente para eu me recuperar!
Meu
marido tinha saído para dar uma volta com meu filho e o cachorro e,
por isso, eu não precisei me preocupar com eles por um tempo. Mas,
infelizmente, justamente quando ele estava fora, o intervalo entre as
contrações diminuiu de a cada 10 min para CADA
MINUTO! Elas passaram a
vir entre 30 a 60 segundos, durando cerca de 1 min cada.
Telefonamos
para a obstetriz de novo e ela falou para eu ligar para o 911 se
minha bolsa estourasse porque a bebê poderia nascer a qualquer
momento! Eu quase surtei e fiquei pedindo a Deus que as obstetrizes
chegassem a tempo. A obstetriz chegou 30 minutos depois. Até lá,
fiquei o tempo todo andando pela casa - pulando, estralando os dedos
e orando durante as contrações. Elas vinham com força, mas eu
estava mais preocupada que a obstetriz não fosse chegar a tempo e
assustada com a velocidade com que as coisas estavam acontecendo!
Eu
precisava tomar o antibiótico pelo menos 4 horas antes do
nascimento, mas não deu tempo – só foi possível tomá-lo com 45
minutos de antecedência. Minha intenção era ter entrado na
banheira, mas àquela altura as contrações já estavam tão fortes
que a banheira não ajudaria. Quando a obstetriz chegou eu já estava
com 7 cm de dilatação. Pouco tempo depois eu já estava em
transição para o momento expulsivo. Ela me sugeriu ficar de quatro
durante as contrações e foi uma posição boa para mim. Boa parte
do tempo eu passei apertando o meu marido quando vinha uma contração
ou recebendo massagens dele na região lombar para aliviar a dor.
Fiquei
decepcionada que a minha doula só conseguiu aparecer no fim, já na
hora de empurrar! A minha bolsa ainda não tinha rompido e a
obstetriz falou para eu sentar no vaso e tentar relaxar. Dito e
feito, assim que me sentei, ouvi e senti a bolsa rompendo! A água
saiu esverdeada e isso significava que havia a presença de mecônio.
Tecnicamente eu deveria ser transferida para o hospital, mas não
havia mais tempo! Voltei para o quarto e me deitei sobre a cama. Eu
queria empurrar com calma dessa vez para não ter lacerações como
da primeira vez.
A
doula chegou e imediatamente me tranquilizou. Ela me ajudou a me
concentrar e a empurrar. Achei incrível que durante TODO o trabalho
de parto continuou havendo intervalo entre as contrações (isso não
acontece quando o parto é induzido!), o que me permitia retomar o
fôlego entre elas. Foi algo fantástico, pra falar a verdade. Eu
tinha ficado apavorada no momento expulsivo da primeira vez e, por
incrível que pareça, o momento de empurrar foi a minha parte
preferida do segundo parto. Senti que, de fato, eu estava FAZENDO
alguma coisa, que é muito diferente de tentar reagir a algo que está
sendo feito a você.
Depois
que a cérvix dilata por completo, a dor das contrações desaparece.
O que você sente no lugar é uma baita pressão. Nesse momento senti
que sabia exatamente o que estava fazendo e como fazer para expelir o
bebê. Quando a pressão cedia, eu também PARAVA de fazer força e
deixava o meu corpo se abrir. Fiz o processo devagar e com cuidado e
consegui parir minha filha sem lacerar o períneo! (Para mim o
processo pareceu durar uma eternidade, mas foram apenas 5 min!) Para
mim, a experiência de
parir em casa foi algo
incrível e eu definitivamente recomendo o parto em casa!
Rebatendo
argumentos comuns contra o parto natural
O
parto natural é muito melhor... para a mãe, o bebê, a amamentação,
o apego emocional mãe-filho, a recuperação pós-parto, as futuras
gestações... enfim, tudo! Estou convencida de que qualquer mulher,
auxiliada por uma doula, consegue parir sem anestesia!
Acho
que as mulheres precisam investir mais na sua educação sobre o
processo fisiológico do parto. A minha inspiração para me educar
sobre o parto foi o filme “The
Business
of Being Born” (Ricki Lake). Abaixo coloquei alguns
contra-argumentos para desculpas comuns para não se ter um parto
natural.
1.
A DOR É INSUPORTÁVEL - Em primeiro lugar, a dor não é
insuportável.
Afinal, fomos criadas para parir! A dor é perfeitamente tolerável.
Ela é intensa, mas sempre desaparece. Além disso, a pelidural
(anestesia) traz riscos
e aumenta complicações tanto para a mãe como para o bebê.
2.
O MARIDO PERDE O INTERESSE NA MULHER – O argumento de que o marido
perde interesse na mulher é balela. A gestação em si altera a
cérvix e a vagina – mesmo as mulheres que se submetem à uma
cesárea sofrem essas mudanças no corpo e têm as mesmas chances de
ter problema de incontinência urinária que uma mulher que tem
parto
normal.
Tive lascerações profundas no meu primeiro parto e foram 6 meses de
recuperação porque eu sentia muita dor. Mas depois que os meus
machucados sararam, TUDO voltou ao que era antes – o sexo voltou a
ser como era para mim como para meu marido. E depois que minha filha
nasceu e
não
houve lascerações (apesar
dela ser uma bebê de quase 4 kg e meio!),
pude voltar a fazer sexo com 6 semanas sem qualquer problema.
3.
O BEBÊ É MUITO GRANDE E NÃO VAI PASSAR - Papo furado essa história
de que o bebê é grande demais para nascer pela vagina. Isso é
raridade e, se acontecer com você, você vai saber a tempo para
poder fazer uma cesárea. Além disso, não é possível saber o
tamanho exato dos bebês dentro
do ventre. As
USGs têm uma grande margem de erro, de até 1 kg se não me engano.
Eu tive
dois bebês bem grandes, então parir uma criança de 3 kg (a média
dos bebês no Brasil) seria um prazer! Se eu consegui parir um bebê
de 4,5 kg, sem anestesia, sem lacerações e sem lágrimas, outras
mulheres também conseguem! Quando eu estava grávida, li sobre uma
mulher que pariu um bebê de 5,5 kg, sem anestesia e sem lágrimas. A
história dela me encorajou porque
como já tinha passado muitos dias da data provável de parto e os
bebês da minha família são GRANDES, eu já estava apavorada!.
Se
você tiver alguma dúvida ou quiser conversar mais a respeito, será
o meu prazer ajudá-la. Meu endereço de e-mail é: nessjoy@gmail.com
Ola, gistaria de saber se eu for so para ter meu bebe no canadá quanto ees cobram pela cesariana? E quanto tempo a mulher fica internada no hospital? Todos fazem?
ResponderExcluirCruzes!!! Depois desse sofrimento todo vc ainda acha q isso foi melhor?? Tem gente q.gosta d sofrer nao e possivel. Devia ter ouvido sua sabia mae
ResponderExcluirOlá, quero saber se você conhece alguma doula brasileira.
ResponderExcluirLinda experiência, Vanessa! Só quem passa por um parto natural sabe dar valor a ele. Não existe nada mais transformador do que permitir que nosso corpo trabalhe na hora e tempo dele pra trazer nosso bebê. Tive uma cesarea e um parto domiciliar também. Este último, inesquecivel. O primeiro, desprezivel.
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